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sábado, 30 de maio de 2009

O Indulto e o Natal sem Papai Noel

Já aconteceu antes. Um preso, com uma ficha criminal de mais de 4 metros se esticada, recebe o indulto de Natal em dezembro de 2008. Como muitos antes e depois dele, não retornou à cadeia. Esta semana, ao roubar um carro onde estavam um pai e seus dois filhos pequenos, disparou contra o motorista na frente das duas crianças, arrastando depois o corpo para fora do veículo e arrancando com o carro, levando consigo os dois inocentes. Após ameaçá-los, deixa-os na rua e parte levando o fruto do furto. Um exemplo entre milhares de outros que têm em comum o fato de um bandido preso ser solto mediante benefício da lei de indulto. Ele teve um Feliz Natal, as crianças vão ter um Natal de órfãos.

“Os cidadãos não poderiam dormir tranquilos se soubessem como são feitas as salsichas e as leis” – disse Otto von Bismarck, ex-chanceler alemão. A isso eu acrescentaria que não durmo tranquila pois muitas perguntas não querem calar. A mais perturbadora para mim é por que a lei brasileira gosta tanto de bandidos. O cidadão de bem, aquele que trabalha e luta contra as dificuldades enraizadas em nosso país, possui um só direito: pagar quatro meses de seu suor em impostos e calar-se em atordoado mutismo. Pergunto-me qual a raiz dessa inversão de valores, onde o crime compensa mais do que a honestidade, e as respostas que me ocorrem não são nada confortáveis.

De um lado, intelectuais com tendências de esquerda que solfejam, em escritórios e salas com ar condicionado, acerca da injustiça social como moto gerador da má índole, enquanto cospem seus chavões ‘humanistas’ sobre a ‘arbitrariedade’ da força policial como resquício da ditadura militar. Do outro, legisladores que possuem interesse em deixar a lei tão elástica quanto possível, afinal muitos são advogados com um grande filão criminal entre sua clientela. Isso sem mencionar, é claro, políticos que lucram com a fraqueza legal brasileira, seja por cometerem delitos ou por cultivarem associações ilícitas com a cúpula marginalia. O resultado: os Direitos Humanos não pertencem a humanos direitos.

Vivi em um lugar muito humilde durante uma fase inglória de minha vida. Não chegava a ser uma Rocinha ou um Buraco Quente, mas tinha lá suas similaridades. O que tirei dessa experiência – e de outras, como estar constantemente no terminal Parque D. Pedro às seis horas da manhã de um rigoroso inverno, vendo centenas de trabalhadores enlatados em um ônibus logo cedo – é que a lei é feita e ensinada pelas pessoas erradas. Perdidas em teorias vãs e sem contato com a realidade, ou simplesmente imersas em seus próprios e escusos interesses, esses professores, sociólogos, juristas, políticos, e quem mais seja, não enxergam – ou não querem enxergar – que a pobreza cria muito mais heróis do que bandidos. Tristemente, a lei brasileira afaga a esses poucos fracos, entregando a grande maioria, digna, à sua própria sorte.