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sábado, 17 de abril de 2010

O Avatar Não é Aqui

Uma vez me disseram que para tudo nessa vida é preciso talento. Acredito que isso é verdade. Até uma prostituta e um ladrão precisam de talento para exercer a profissão, caso contrário, farão lambança. Prostituta que se preza cuida do corpo, faz sexo bem, cobra alto, não pega AIDS, trabalha em ambientes fechados e, no caso da Bruna Surfistinha, publica um livro campeão de vendas relatando suas peripécias. Ladrão que se preza entra quieto e sai calado, não rouba armado, rouba quem tem seguro, dá golpes milionários sem vítimas ou testemunhas oculares, normalmente deixando todo mundo boquiaberto pelo grau de ousadia e destreza.

James Cameron tem talento para verbas milionárias e para diluir boas ideias em filmes que se vão sem maiores consequências. Ousou fazer a sequência do aclamado ‘Alien, o Oitavo Passageiro’, de Ridley Scott, demonstrando que nem só de orçamento vive um filme ao mostrar um pastiche militar que, não fosse o dinheiro investido em parafernália, seria digno de dó. ‘Titanic’ é o recordista de erros e perde feio em dramaticidade para o original do ano de 1953 – como ele veio a ganhar o Oscar de melhor direção por ele, é um enigma na indústria cinematográfica até hoje. Seu blockbuster ‘Avatar’ ganhou Oscar por efeitos especiais – com 500 milhões de dólares de orçamento e atores de baixo cachê, quem não ganharia?

A mais recente infelicidade concebida por este diretor das multidões foi achar que o Brasil é terra de ninguém. Há dez dias ele perambula por aqui, primeiro dizendo-se afrontado pela construção da usina hidrelétrica de Belo Monte no Pará, depois se vestindo de índio em manifestação onde deixou claro que “vai utilizar de todos os meios para evitar a construção da usina”. Declarou que a Amazônia será palco da sequência de ‘Avatar’ e plantou árvores no Parque do Ibirapuera em São Paulo. Note-se que em momento algum ele mencionou que os Estados Unidos, juntamente com a China, é o campeão de destruição ambiental. E, sendo canadense, nem passou perto do massacre anual dos bebês focas.

Não sou fã do Lula, mas talento para frases certeiras, isso ele tem. Quando disse, “Depois de destruírem o deles, vêm aqui dar ordens”, fui obrigada a fazer minhas as palavras dele. Todos os países desenvolvidos poderiam plantar toda uma Amazônia, mas querem a nossa, já que ela está aí, prontinha. Em Copenhague, relutaram em assumir sua cota ecológica. Nossos índios, bem ou mal, persistem, nos Estados Unidos foram mortos a tiros por causa de uma porcaria árida como o Texas. É duro ser brasileiro. Um belo dia, eis que você liga a televisão e é obrigado a ver, além das consequências da nossa caquética legislação, um diretor estrangeiro de quinta categoria cantando de galo no nosso terreiro. Falta de talento – no caso, o dele e o nosso – dá nisso. Viva a Bruna Surfistinha!

sexta-feira, 9 de abril de 2010

A Eterna Tragédia Brasileira

Certo, a casa caiu – quero dizer, o morro caiu. Todos nós agora com nossos voláteis olhos voltados a todos aqueles que algum dia decidiram que uma casa no morro é tão boa quanto qualquer outra. Todas as línguas agora maldizendo o prefeito do Rio de Janeiro. Todos os superficiais corações sofrendo numa única corrente, pra frente Brasil, salve a seleção. Enfim, todo um país diante de uma tragédia anunciada acreditando que o problema é de agora e que, sim, o culpado pode ser rastreado por seu nome e número de RG (ou título eleitoral).

Nelson Pereira dos Santos filmou ‘Rio 40 Graus’ na década de 50 – e já havia favelas no morro. As favelas não apenas aumentaram como continuaram a se alastrar em diferentes morros. Quantas gerações desde então? Quantos governos (situação e oposição) desde então? Seja como for, claro está a olhos e mentes mais atentos que o problema vem se arrastando há décadas: o problema de administrações que não agem e de populações que não se responsabilizam por sua própria vida, nem que seja em benefício próprio.

Quem é o responsável por essa pobreza que se expõe em áreas de risco e não sai dali nem arrastada? Melhor seria perguntar o que gera essa específica pobreza? Ou então quem é o responsável por administrar os efeitos sociais dessa tal pobreza? De qualquer forma, foi-se a década de 50 e estamos, mais de sessenta anos depois, chafurdando (agora literalmente) nos mesmos problemas. Como tudo isso aconteceu, acontece e, Deus nos livre e guarde, acontecerá? Seria o povo brasileiro 'vítima' de tamanho descaso e emocionalismo vãos ao ponto de não perceber que o buraco é e sempre foi mais embaixo?

O morro caiu e sempre cairá. Enquanto houver uma cultura populista e de irresponsabilidade pessoal, social e administrativa, o morro sempre cairá. Não adianta mandar bombeiros, não adianta mandar mantimentos e doações, o morro sempre cairá. Cairá enquanto os pobres não assumirem sua pobreza com dignidade e enquanto o governo usar a falta de dignidade dos pobres para seus próprios fins. Cairá por todo o tempo em que durar a indiferença das pessoas em relação a si mesmas e aos outros. Enquanto neste país perdurar o imediatismo aliado à inação e ao proveito próprio, morros cairão – pois o morro, com ou sem favelas, sempre cai. É da natureza do morro cair.