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quinta-feira, 13 de agosto de 2009

A Culpa e a Vergonha

Uma vez, durante um seminário no Teatro Escola Macunaíma, tive o prazer de assistir a uma palestra de um sociólogo do qual infelizmente não me recordo o nome. Entre outras coisas, foi levantada a questão da diferença entre a culpa e a vergonha. A sutileza, desses que são sentimentos humanos por excelência, mereceu algumas horas de consideração de minha parte, não apenas na época, mas durante esses últimos tempos, onde escândalos de corrupção política em Brasília parecem contradizer qualquer esperança, não apenas de retaliação, como também de retratação.

Tanto a vergonha como a culpa nascem de alguma forma de interação social, embora suas naturezas divirjam quanto ao gatilho que as disparam. Imagine-se em um elevador na companhia de outras pessoas que não sejam de seu contato mais íntimo. O espaço exíguo automaticamente sugere proximidade física não condizente com o nível de relacionamento com seus companheiros nessa curta viagem comunitária. De repente, pesadelos dos pesadelos, você não consegue refrear os sonoros gases que a maravilhosa couve do almoço gerou em seu intestino. Vergonha, sim, mas não é culpa sua não conseguir esperar por um momento mais apropriado.

Por outro lado, para que possamos sentir tanto uma quanto outra, é necessário haver consciência, é necessário que, de uma forma ou de outra, consideremos importantes nossas interrelações com os outros e que haja um mínimo de autoavaliação de nossos atos e suas consequências. Sem isso, qualquer atitude, por mais nociva ou vexatória, passará ao largo de qualquer percepção e, em decorrência, serão anuladas as possibilidades de fazer algo que, se não corrigir, irá ao menos minimizar os efeitos e gerar aperfeiçoamento para que ações futuras sejam mais felizes e pertinentes.

Os orientais são famosos por sentirem vergonha, pois valorizam o orgulho e a dignidade. De forma inversa, os ocidentais – os latinos em especial – possuem inclinação mais enfática à culpa, pois suas regras pessoais e sociais são historicamente mais elásticas, portanto, há espaço para contravenção. Sempre há espaço para driblar o arrependimento e para fugir à punição. Se no deprimente caso no elevador não havia nada que se fazer – a não ser maldizer à couve pelo apuro – em nosso Senado, particularmente no caso do senhor José Sarney e associados, não há desculpa, mas apenas a incapacidade se cultivar honestidade e uma saudável dose de vergonha na cara.