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sexta-feira, 13 de novembro de 2009

A Leila do Pasquim

‘O Pasquim’, para os que não eram nascidos ou são novos demais para se lembrarem, foi um jornal publicado de 1969 a 1991. Ironicamente, aquilo contra o que lutou – a censura imposta pelo AI5 – foi também o que o alimentou, pois não durou muito após o fim da ditadura militar no Brasil. Nele trabalharam nomes de peso como Millôr Fernandes, Paulo Francis, Jaguar, Ziraldo, Henfil, entre outros, vivos ou mortos. Irônico, escrachava costumes com refinada inteligência. Dentre todas as edições ‘subversivas’, foi a que tinha Leila Diniz na capa que fez com que toda a equipe editorial sofresse um ‘surto de gripe’, da qual só se recuperaram três meses depois (na realidade, estiveram presos).

Leila Diniz foi uma atriz que quebrou tabus, escandalizou ao exibir sua gravidez em um biquíni na praia e chocou o país inteiro ao proferir a frase: Transo de manhã, de tarde e de noite. À frente de seu tempo, era ousada e detestava convenções. Foi invejada e criticada pela sociedade machista das décadas de 60 e 70. Era malvista pela direita opressora, difamada pela esquerda ultra-radical e tida como vulgar pelas mulheres da época. Além de ser jovem e bonita, era mulher de atitude. Trabalhou na Rede Globo, que não renovou seu contrato e sobre o fato a novelista Janete Clair comentou que não haveria papel de prostituta na próxima novela. Leila morreu em um desastre de avião em 1972.

Quem chegou até aqui pode estar pensando: “É, as coisas eram assim naquela época”. Ledo engano. Estamos em 2009 e resquícios dessas ignorâncias retrógradas, digamos que justificáveis na época, persistem quando não mais há desculpa. Afinal, imagina-se que a sociedade evolua de alguma maneira, que tabus sejam quebrados e que as pessoas aprendam com os erros. Infelizmente – e apesar das aparências – não é bem assim. O teor erótico de nossos programas de televisão e uma aparente liberdade de imprensa camuflam que “ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais” – como diria Belchior.

Dois rápidos exemplos, entre outros. A pedido de Fernando Sarney, filho de José Sarney, o desembargador Dácio Vieira proibiu o jornal ‘O Estado de S. Paulo’ e o portal Estadão de publicarem reportagens que contenham informações da Operação Faktor, que investiga a suspeita de que ele teria feito caixa dois na campanha de Roseana Sarney na disputa pelo governo do Maranhão. Por outro lado, uma aluna da faculdade UNIBAN teve que sair escoltada pela polícia por que seus colegas de classe se revoltaram por ela estar de mini-saia e só não foi expulsa da faculdade pela pressão da imprensa. Incrível como ‘O Pasquim’ e a Leila continuam atuais, não é mesmo?